Caetano Veloso nos faz refletir a relação entre 'tu' e 'você' - podcast episode cover

Caetano Veloso nos faz refletir a relação entre 'tu' e 'você'

Apr 17, 202519 min
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Summary

Professor Pasquale analisa a conversa entre Caetano Veloso e Carminho sobre as diferenças no uso de 'tu' e 'você' entre Brasil e Portugal. Ele explora como 'você' carrega diferentes conotações de formalidade e intimidade em cada país, ilustrando com canções de Noel Rosa, Vadico e Caetano Veloso. O episódio destaca as sutilezas e evoluções da língua portuguesa em diferentes contextos culturais.

Episode description

O professor Pasquale parte de uma conversa entre Caetano Veloso e Carminho para discutir a utilização dos termos 'você' e 'tu' - entre Brasil e Portugal. Para explicar, ele conta, além da conversa entre Caetano Veloso e Carminho em setembro de 2021, em Lisboa, com os auxílios luxuosos 'Pra que Mentir', de Vadico e Noel Rosa, com Caetano Veloso, e 'Dom de Iludir', de Caetano Veloso.

Transcript

de Portugal. Nossa língua de todo dia, com o professor Pasquale. Professor, boa tarde, parabéns. O professor também faz oito anos nesse programa, minha gente. É, desde o primeiro, desde 17 de abril de 2017. Boa tarde, Tati. Boa tarde, Fernando. Boa tarde, ouvintes. Posso dizer algumas coisinhas? Então, primeiro, a Tati fez uma abertura lindíssima. Eu fiz questão de ouvir. Parabéns, Tati. Um texto lindíssimo. Fiquei comovido. Depois... a partir desse seu texto

Eu faço questão de repetir o que eu já disse aqui algumas vezes. Nós construímos um espaço civilizatório. vocês sobretudo o trio Janaína Tatiana e Fernando os colunistas também entram nisso e os entrevistados também mas o princípio de vocês é o da civilização tão estranhos, para dizer o mínimo, nós fazemos um programa, deste programa, um espaço civilizatório. Eu fiz uma conta simples.

Nós já passamos de dois mil programas, aproximadamente dois mil e oitenta programas, de modo que eu já devo ter passado dos quatro mil auxílios. Meu Deus! E o professor não falta, viu? Não falta. E quando falta, deixa gravar. Quando não pode estar ao vivo, deixa gravado. Ele não falta mesmo. Então, são mais de 4 mil, porque eu nunca ponho menos de 2, né? Raramente ponho um só auxílio, são mais de 4 mil.

Auxílios. Agradeço imensamente ao ouvinte, eu peguei um pedaço ao ouvinte, Patrícia, Patrícia de Marques, será que é isso? É ela mesma. Pela referência e, para fechar esse comentário inicial, vocês citaram aquele episódio do... da gargalhada, né? Que vocês caíram na risada, ficou todo mundo. Então, aquilo foi com o ouvinte Gustavo Carali, né? Eu até citei os nossos queridos Antero Greco, que está no céu, e o Paulo Soares, aquele episódio deles.

no programa que faziam juntos quando o São Paulo tentou contratar um jogador que acabou não contratando, cujo sobrenome, um jogador cujo sobrenome era Caraglio, em italiano, GLI. E brincadeira foi, brincadeira veio, o nosso ouvinte respondeu, tô com a mensagem dele aqui, dizendo, meu sobrenome... caralho mesmo, por mais que pareça brincadeira.

Segue foto para comprovar. Ele mandou uma foto da carteira de habilitação dele. Ai, caralho, caralho. Fiquem tranquilos que eu não levo a mal. Vocês devem imaginar que para mim é comum todos... se chocarem com o meu sobrenome. Então, querido Gustavo, tá vendo? Você é personagem de um desses dois mil e oitenta programas que nós fizemos. Que nos causou uma quase sem fim crise de riso. Coitado do Fernando que ficou aí na frente da câmera tendo que segurar.

O professor começou a contar a história do caralho e aí eu consegui respirar, voltar a mim mesmo. A redação tinha um três jogado no chão, dois assim na cadeira de morrer de rir. Foi difícil, foi barra. Mas ainda bem que foi por motivo de riso. Teve outros episódios aqui também que, enfim, por outros motivos não tão felizes, eu não consegui apresentar esse programa, por exemplo.

Enfim. Mas foi bom demais. Foi muito bom. Tem sido bom demais. Continuará sendo bom demais. Vamos nessa. Vamos lá, professor. O que temos hoje? Então, ontem nós falamos, nós continuamos o assunto levantado por um ouvinte sobre a história do necessário, do preciso e pá pá pá, aí eu toquei. Caetano Veloso sozinho, Caetano Veloso e Carminho. aquela canção chamada Os Argonautas, depois pus uma canção de Ivan Lins e Vitor Martins, chamada Um Fado. Você não estava ontem, Tati?

Fernando gostou demais da música, e a música mexe com essa questão do... E aí, no meio da conversa, eu falei... de uma conversa entre o Caetano e a Carminho. uma conversa que eles tiveram lá em Lisboa, em setembro de 2021, e essa conversa nasce justamente pela dificuldade que a Carminho tem, ela manifesta isso. A dificuldade que ela tem quando ela canta uma música brasileira é a dificuldade de usar você.

Ela até se atreve a trocar esse você por tu. E ela vai explicar. Então, a gente vai ouvir agora um trecho, um trecho de dois minutos. Dessa conversa entre eles, Caetano e Carminho, mediada pelo Gavan, querido Gavan, baterista, Nosso ouvinte. Adoro. Nosso ouvinte, eu mando um beijo pra ele. Ele é de uma simpatia única. Tem nem roupa pra ser ouvida pelo Gavan, gente. De uma gente... Você não tem ideia de quanto ele é gentil. É um absurdo. É um poço de gentileza.

Então, vamos ouvir esse trecho, prestem atenção no que diz o Caetano. fala uma coisa ou outra, mas quem fala mais nesse trecho... Quando foi essa conversa, professor? Essa conversa foi em setembro de 21, lá em Lisboa. Vamos lá. E a partir de uma canção que eu não vou tocar, posso tocar até amanhã, que é uma canção absurda, é um absurdo, chamada Você, Você, é uma coisa de louco, é uma aula.

É uma coisa monumental, monumental. O Brasil devia pôr isso nas escolas, as pessoas deviam aprender o que significa essa letra, mas ela vai ficar para outro dia, talvez amanhã. Vamos ouvir então... Caetano Veloso e Carminho conversando em Lisboa, num estúdio muito bonito, com a mediação do nosso querido Gavan. Vamos lá. mas ainda à procura da verdade eu acho que o mais importante tanto nesta canção como nas questões que tu levantaste na relação às escolhas tem a ver com

Estamos ou não à procura da verdade? Estamos ou não a ser honestos quando cantamos? Eu não canto você, por uma razão muito... Eu acho simples de explicar, mas difícil de no Brasil entender, só por uma simples razão, é que o você é tão natural. no tratamento entre as pessoas. E em Portugal, quando nós nos dirigimos a alguém por você... É alguém a quem temos muito respeito e quem sabe nós não o conheçamos. Ou que é muito mais velho, ou que é a nossa avó, a nossa mãe que temos a respeito.

Até pode haver uma intimidade, mas é um sinal de ascensão. É de baixo para cima. E não utilizamos a palavra você, nós utilizamos o tempo verbal. Nós não utilizamos você vai a algum lado. A mãe vai, por exemplo, ou vai. a pessoa, o nome da pessoa e o resto do tempo E nesse sentido, se eu estava a dirigir-me a uma pessoa amada, e se eu quero que essa pessoa acredite em mim, quando eu lhe digo que a amo, eu não consigo dizer o tempo verbal. de alguém que não é ele, a quem eu nunca me dirigiria.

Por você, a quem amo, porque é o sinal de máxima intimidade. Tu, eu amo-te. E é a ti que eu amo. Para que ele acreditasse em mim, esse ele romântico, esse ele romântico, o ele romântico, esse tu romântico da canção, eu teria de tratá-lo por tu. Isto é uma discussão porque... Porque veio de um atrevimento grande meu, porque eu cantei todo um repertório de Tom Jobim escolhido, e ao contrário do que o Caetano dizia... Professor, que conversa linda, não?

Se nós tivéssemos umas 20 horas de boletim de Sim Sem Parar, eu teria colocado a canção inteira. do Caetano, chamada Você, Você, mas eu vou colocar amanhã ou outro dia. Mas então, você viu o que disse a Carminho? Ela disse que para ela não dá para cantar Você. Se você é o ser amado, porque você, em Portugal, A palavra você, o pronome você está preso à origem, né? Então, de onde vem você? Vem de vossa mercê, que depois passa para vossa mercê, depois passa para vós mercê, depois passa para você.

Esse vossa mercê era e é uma expressão de tratamento de respeito, de distância. de formalidade, é de baixo para cima, como ela diz, como a Carminho diz. E no Brasil, com o tempo e com o uso, esse você deixou de ser tudo isso, perdeu essa marca do distanciamento e virou um pronome de intimidade. Coisa que em Portugal é tu.

Então, eles ouvem o você de um jeito totalmente diferente do que nós ouvimos. E nós ouvimos o tu do mesmo jeito que eles ouvem, porque em muitos lugares do Brasil existe o uso de tu. às vezes com o verbo conjugado na segunda pessoa, como em Belém, por exemplo, tu és, tu dizes, tu fazes, Às vezes, como se conjuga no litoral paulista, no Rio de Janeiro, tu fez, tu falou, quer dizer, o pronome de segunda com o verbo conjugado naquilo que a gramática padrão chama de

Terceira pessoa. Então, a Carminho explica com muita propriedade isso. No Brasil, as canções populares já se valeram muito do tu em vez de você. Até o começo do século passado era assim. E eu vou provar isso, mostrar isso com uma canção composta por Vadico. A gente já falou dele aqui mais de uma vez. O João já fez uma coluna sobre ele. Vadico é o apelido de um músico paulista chamado Osvaldo Goliano.

Essa canção que a gente vai ouvir é do Vadico, que fez a melodia, e do Noel Rosa, que escreveu a letra. e se chama Pra Que Mentir? Vejam como são usados os pronomes nessa canção, nessa letra de Noel Rosa, com melodia de Vadico, interpretação de Caetano Veloso. Vamos lá. para que me não tens, se tu ainda não tens se tu sabes que eu sei Se eu sei que tu gostas de mim...

E por aí vai. Noel Rosa, que é o autor da letra, escreveu como se fazia na época ainda. Era muito comum isso. Na segunda pessoa, dita clássica, tu... como em Portugal, como se faz em Portugal. E essa letra do Noel é tida hoje como machista, como preconceituosa, porque... Ela diz, se tu não tens ainda a malícia de toda mulher, né? Pra que mentir se eu sei que gostas de outra e tal? E aí o que fez o Caetano Veloso, gênio, maravilhoso? Escreveu uma canção...

que é uma espécie de resposta a essa canção, para que é mentira, de Vadico e Noel Rosa. A canção que o Caetano escreveu se chama Dom de Iludir. E ele gravou isso em 1987, num show ao vivo no Copacabana Palace, 86 aliás, desculpem. Está no disco Totalmente Demais e ele canta as duas canções, se eu não me engano, emendadas. E vocês vão ver que a letra é uma espécie de resposta. E prestem atenção no que fez o Caetano com os pronomes e em que pessoa Caetano escreveu a letra. Vamos lá.

Você diz a verdade, a verdade é o seu dom de iludir, então se você ilude, como é que você pode querer que a mulher viva sem mentir? Isso é um mentiroso, né? E o Caetano escreve essa letra todinha em você. Não me venha, você... Aliás, ele cunha aí uma frase antológica. Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é. Isso é um... Isso é uma coisa de doido, né? Uma coisa de doido. Uma grande máxima da vida, né? Isso é usado muito.

Virou frase espontânea. É uma frase antológica, uma máxima perfeita, um negócio incrível. Não me olhe... como se a polícia andasse atrás de mim, cale a boca e não cale na boca, você sabe explicar, você sabe entender, você está, você é, você faz, você quer, você tem. você diz a verdade, tudo isso você, você, você, você. Então o Caetano responde a letra do Noel já no português.

que se consagrou no Brasil, que é o português desse jeito, aquele que a Carminha tem dificuldade para absorver, porque, como ela diz, para eles lá, você. É outra coisa, você é distância. E fica essa coisa que é muito bonita. Aliás, é bom que se diga, alguém vai dizer, ah, o Caetano não sabe escrever na segunda pessoa, por isso que ele escreveu na terceira. Mentira das grossas. É só pegar aquela canção que eu já toquei aqui mais de uma vez. Meu Deus do céu.

Língua. Como é que chama essa música, meu Deus? Onde queres revólver, sou coqueiro. Bruta flor do querer. Como é que chama? Agora me fugiu. Que vergonha. O Quereres. O Quereres, Caetano. Fernando, muito obrigado. O Quereres. Olha só. O Quereres. Então Caetano dá uma aula ali, ele usa a segunda, ele sabe tranquilamente trafegar por tudo isso.

E em suma, fica aí para os ouvintes esse, entre aspas, eu vou me atrever a dizer que é um presente de aniversário do programa, essa coisa de compreender as sutilezas do português daqui. e do português de lá. O próprio Caetano diz, ele me disse isso uma vez, e disse no Nossa Língua Portuguesa, que ele gostaria muito de um português Middle Atlantic, como ele fala, que é o português do meio do Atlântico. E por aí vai. Acho que eu estourei meu horário. Desculpem, perdão. Obrigada.

Um beijo grande. Bom feriado. Terça-feira nos falamos novamente. Ou amanhã, ou segunda, com a Gabi Echenique por aqui. Um beijo, professor. Você se cuide, viu? Beijo, Tati. Beijo, Fernando. Beijo, ouvintes.

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